Sem.tido


- E o que tenho a perder, se já nos perdemos?

Orgulho-me do meu currículo de quatro páginas em que na própria descrição me apresento com verdade e sem modéstia como super experiente ('excelente' encaixaria também). Em matéria de lidar com gente, eu entendo e cuido e resolvo. Exceto quando essa gente atravessa a barreira de proteção, exceto quando a gente me invade.

Não tenho nada a perder, já me perdi.

Eu sou ok. Eu sei que sou ok. Tenho virtudes pra caralho. E me conheço profundamente pra saber em quanto de merda tive que nadar pra poder encontrar fôlego.

Policio-me todo dia pra me manter inteira. E não é pelo trabalho difícil, não é porque massageio por três ciclos seguidos, ou mais, uma criança em parada, mesmo com o suor da minha testa caindo na dela. Ninguém faz um coração bater como eu. Na minha mão não permito que morra.

Talvez essa seja uma questão, faço de tudo, cansada, quase sem forças, faço de tudo pro outro coração bater. Só que, talvez, isso de que tanto me orgulho seja na verdade dificuldade em deixar partir.


Te vi hoje. Doeu.


É irritante saber a razão das coisas "dói porque acabou antes que eu pudesse tirá-la do pedestal, ela segue sendo um monte de projeções, expectativas e ideias, eu mal a conheço pra saber o que é real".

É irritante e triste entender a razão da dor e não dar conta de anulá-la.

É realmente irritante saber tinhamos um beijo ok, um sexo meieiro, que tinha que medir palavras e carinhos, que precisávamos manter o pé atrás, e que ainda assim, dói TANTO também saber que depois de um quarto ou quinto encontro, não haverá o quinto ou sexto.


Tudo com você era comedido, exceto o alcool. Falo por mim. Não entendo. Sempre meio assustada, meio cheia de dedos. Não me sentia à vontade com você, no papo ou na cama. Não éramos confidentes ou parceiras. Éramos encontros casuais no fim de semana quando dava tempo, quando encaixava de me dar migalhas no intervalo da sua agenda. Como se minha vida fosse mais leve que a sua e eu tivesse que aceitar. Mas eu aceitava e não via a hora da migalha chegar.


Puta que pariu. Como você mexe comigo.


Me sacode inteira por dentro, bagunça meu juízo. Não faz o menor sentido te querer tanto comigo. E não é te diminuindo. Você é realmente maravilhosa e eu te admiro tanto que perco as palavras, acho que me encantaria por você em todas as vidas se houvesse. Mas você comigo, eu e você, não funciona, não existe e portanto nao faz sentido. Como pode uma hipótese machucar tanto, meu Deus?


Não conseguiria, nem quis ou quero, imaginar um futuro com você. Mas, menina... como eu queria o presente. Eu no seu cangote, você na curva do meu pescoço quando me abraça. Como eu queria sua mão na minha naqueles raros segundos que a gente se permite. Como queria não parecer intimidadora, se quando te encaro é só pensando em "velho, eu quero muito você pra mim".


Meu Deus como dói. E não é só o conflito. Ele também, mas não só. Aparentemente eu não sou só razão.  Às vezes eu esqueço. Me blindo de várias maneiras, lido com a dor alheia todos os dias. Com a minha também. Muito bem. Mas dessa vez está difícil: não faz sentido. Talvez seja isso.

Não faz sentido.

Que te quero tanto depois de uns cinco encontros covardes, pisando em ovos, pela metade.

Talvez por isso?

Te queria inteira. Nos queria inteiras.

E dói saber que acabou antes de chegarmos perto disso.

Poderia listar suas mil qualidades, elas podem até justificar o querer, não a dor. Parece que dessa vez a razão não pode explicar. Não é a razão que aperta meu estômago, me faz gaguejar e acelera tão fortemente essa porra desse músculo incansável, que quase cansa de tanto bater quando te vê.


Mas o suor já está caindo, estou perdendo as forças.

Preciso te deixar partir.

Com dor, e um pouco de amor, que eu não poderia explicar.


Fica bem.

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